domingo, 31 de março de 2019

347 - Infância!

347  -  Infância!


Como os fatos da infância nos marcam!  Há cenas que ficaram tão gravadas  no subconsciente que, ao pensarmos nelas,  é como se as vivêssemos hoje, tal é o poder da mente humana. É fantástico tudo isto! Até as vozes, as cores, os arrepios, as mais estranhas sensações são revividas, quando trazemos à tona os fatos de nossa infância. 

Interessante notar como uma situação vivenciada por várias pessoas, algumas se lembram perfeitamente e outras nem tanto. Portanto, guardamos aquilo que, de certa forma, nos marca por algum capricho da mente. 

Lembro-me do sobrado onde morávamos, da escadinha muito rústica, do porão, onde os animais se abrigavam à noite, dos enormes pés de mangas, da mina lá no fundo do quintal, das plantações, da estrada por onde passávamos para ir à escola, da igrejinha, do trajeto para a casa do vovô...

Lembro-me de meu pai na janela do seu quarto, jogando lá de cima umas mexericas pra nós, enquanto minha mãe lá estava, em trabalho de parto. E alguns dias depois, meu irmãozinho tão novinho, sofrendo com a catapora,  que castigou a turma toda. 

E uma lembrança bem triste do meu irmão mais velho, abrindo a cabeça da minha irmã com um enxadão, ao fazer uma cova para plantar uma bananeira; sem querer, é lógico! Ela caiu na cova, o sangue jorrou em demasiado, e nós ficamos apavorados, sem saber o que fazer. Pensamos que ela estava morrendo. Foi terrível! 

Lembro-me de muitas outras coisas, mas um fato que me fez ficar muito tempo com medo e que até hoje sinto arrepios ao lembrar, foi o tremendo berro daquela vaca brava!  Estávamos indo para a casa  de Dona Alaíde pra brincar um pouco. Creio que nossos pais iriam depois e voltaríamos com eles. Estava começando a escurecer e de repente ouvimos um berro enorme. E vimos uma vaca brava correndo em nossa direção. Apavorados, não sabíamos o que fazer. Trememos da cabeça aos pés e nem teríamos pernas pra correr! Do nada, apareceu um senhor que levantou rapidamente o arame mais baixo da cerca e nos jogou do outro lado, se arrastando ele mesmo, logo em seguida, arquejante e assustadíssimo! De olhos arregalados, prostrados ali no chão, vimos  o enorme animal, com bufadas ameaçadoras, correr pra lá e pra cá, encarando-nos e batendo a cabeça no arame farpado, ferindo o chão com as patas, mostrando sua superioridade, com seus chifres gigantescos, olhos que lançavam chispas de fogo. Parecia querer devorar-nos a todos. Só muito tempo depois,  ela se cansou e desistiu de seu intento, voltando aos berros para o  lugar de onde viera. Nenhum de nós tinha voz para dizer qualquer coisa. Aquele senhor nos explicou que ela acabara de parir e prenderam seu  bezerrinho, acho que esperando descer o  leite. E que ela, a vaca Mimosa, ficava assim, muito brava,  toda vez que lhe tiravam o bezerrinho recém-nascido. 

Minhas lembranças param por aí. Não sei quem é o senhor, não sei se ele nos levou pra casa, nossa ou do Sr. Agostinho - lembrei-me agora do nome dele, o esposo de Dona Alaíde - nem se meus irmãos se lembram desse episódio malvado que me faz tremer até hoje ao pensar o que poderia ter acontecido se aquele senhor não aparecesse no exato momento daquela investida. Fico toda arrepiada ao pensar o que ela não faria conosco, com aqueles seus chifres assassinos e a  revolta em que se encontrava...  Ai!  Que medo!

Lembranças apenas, graças a Deus! E apesar do susto, um final feliz.

(Celina - 30/03/19)